A partir do século XVII, na Europa, ocorre um grande movimento de internação, quando pobres, desempregados, criminosos e insanos são colocados juntos em casas correcionais ou em “hospitais”. As mais das vezes essas casas ou “hospitais” eram dirigidas por pessoas com poderes absolutos sobre os internos, como os de decidir, julgar e executar. Avançando no tempo, Philippe Pinel, inspirado no estudo de cientistas progressistas de sua época como Locke e Condillac, de escritos de ciências, matemática, de fisiologia e de humanismo, encontrando os insanos naquele universo de pessoas internadas, entendeu ser a sua libertação uma imperiosa necessidade, pois não sabia se os sintomas mentais apresentados por eles eram resultantes da doença mental ou dos efeitos das correntes. Entretanto, essa libertação, embora importante sob um ponto de vista histórico, epistemológico e humanístico, resultou, com o correr dos anos, num outro aprisionamento dos doentes mentais, alocados agora em lugares específicos: os manicômios. Estas casas, passo a passo, passaram a inchar e se tornaram demasiadamente populosas, fato que impossibilitava um tratamento adequado a tantos doentes mentais. Em todos os locais do mundo ocidental criaram-se esses manicômios, aqui no Brasil bem representados pelos hospícios Pedro II, no Rio de Janeiro, Juqueri, em São Paulo e São Pedro no Rio Grande do Sul. A bem da verdade, é necessário dizer que os recursos terapêuticos nessa época eram muito precários. Por isto, após o nascimento de medicações psiquiátricas mais precisas, como os antipsicóticos e os antidepressivos, e de outras medidas psicossociais, foi possível reverter essa situação, desafogando essas casas já nas décadas de 50 a 70 do século XX. Quando em 1808 Esquirol, discípulo de Pinel, lançou seus conceitos sobre a “monomania homicida” encontrou forte resistência tanto de médicos como de magistrados. Esta resistência foi intensificada a partir do ano de 1827. Porém, esses conceitos passaram a fazer parte no julgamento de criminosos, notadamente dos parricidas. Os psiquiatras dos tribunais franceses, em 1835, tendo a frente Esquirol, emitiram pareceres no julgamento de um parricida (que muitos consideravam louco) condenado à morte e que pediu clemência. Ao que parece, inicia-se aí, na prática, a participação da psiquiatria na justiça penal, conseguindo a comutação da pena de morte, caso devidamente publicado nos “Annales d`hygiène publique et de médecine legale”. Ibid Esta revista publicava resumos de fatos e perícias médico-legais na época. CONTINUA
De acordo com Castel (Apud Peres), “a identificação da loucura nestes casos funcionava, por um lado, como impeditivo à aplicação das sansões penais (uma vez que faltava a responsabilidade do sujeito pelo ato praticado, a qual era a base da escola clássica do direito penal) e, por outro lado, servia como justificativa para a necessidade de um espaço próprio para reclusão e tratamento, além de afirmar a necessidade de um especialista para o seu diagnóstico”. Aberta essa porta de entendimento, criaram-se os manicômios judiciários em diversos países, como na Inglaterra, França e Estados Unidos, locais destinados aos doentes mentais que praticaram delitos. Aqui em Porto Alegre foi criado o Manicômio Judiciário em 4 de abril de 1925, o segundo no país, congregando pacientes até então internos no Hospício São Pedro. Essas medidas também foram importantes de um ponto de vista científico e prático da assistência psiquiátrica, possibilitando um acolhimento mais compreensivo e um mais adequado tratamento dos comprometidos. Entretanto, assim como a “libertação” dos doentes mentais realizada por Pinel em 1793, novos problemas e desafios surgiram a partir do isolamento dos serviços psiquiátricos forenses em relação aos sistemas de saúde no mundo ocidental, pois as casas de custódia e tratamento permaneceram ligadas aos sistemas de segurança. Por sua vez, o crescimento da criminalidade é responsável pelo aumento populacional nas prisões e nas casas de custódia e tratamento (instituições psiquiátrico-forenses). Por extensão, os pedidos de avaliações psiquiátricas determinadas pelos juizes das varas criminais abarrotam a agenda das instituições psiquiátrico-forenses. O assunto a ser desenvolvido neste estudo procurou buscar dados ou informações a respeito de transtornos mentais em presídios no mundo ocidental contemporâneo e sobre a situação em que se encontram os doentes mentais internos nas instituições psiquiátrico-forenses ou em casas de custódia e tratamento. Naturalmente, essas situações serão foco de pesquisa também em nosso país, além de contribuições obtidas da experiência psiquiátrica adquirida no Instituto Psiquiátrico Forense “Dr. Maurício Cardoso” do Rio Grande do Sul (IPFMC). O estudo aqui feito é inicial e não possui a pretensão de esgotar o assunto, ao contrário, tem o propósito de uma abertura para que outros se sintam cativados a penetrar nessa extraordinária dimensão do ser humano tão pouco estudada, esclarecida e desafiadora à psiquiatria e à Lei.
O Observatório da Violência e dos Direitos Humanos constitui-se em espaço de monitoramento da violência e da violação dos Direitos Humanos na região de Guaíba no Estado do Rio Grande do Sul. Este observatório vincula-se ao curso de Direito da Universidade Luterana do Brasil, campus Guaíba, estando sediado nesta unidade e agrupando acadêmicos, professores e pesquisadores que tenham afinidade com a temática referente à questão da violência e dos Direitos Humanos. O observatório tem como visão tornar-se referência regional no monitoramento da violência e do desrespeito aos Direitos Humanos e como missão o comprometimento com a prática destes direitos, no sentido de construir instrumentos práticos e teóricos que busquem a transformação social. Ressalte-se ainda, que o Observatório possibilita aos acadêmicos uma nova experiência sintonizada às linhas de pesquisa previstas no Projeto Pedagógico do curso de Direito, articulando ensino, pesquisa e extensão.
Entre em contato pelo email:
observatorio.ulbraguaiba@gmail.com
Coordenação do projeto: Prof. Alberto Wunderlich.
A partir do século XVII, na Europa, ocorre um grande movimento de internação, quando pobres, desempregados, criminosos e insanos são colocados juntos em casas correcionais ou em “hospitais”. As mais das vezes essas casas ou “hospitais” eram dirigidas por pessoas com poderes absolutos sobre os internos, como os de decidir, julgar e executar.
ResponderExcluirAvançando no tempo, Philippe Pinel, inspirado no estudo de cientistas progressistas de sua época como Locke e Condillac, de escritos de ciências, matemática, de fisiologia e de humanismo, encontrando os insanos naquele universo de pessoas internadas, entendeu ser a sua libertação uma imperiosa necessidade, pois não sabia se os sintomas mentais apresentados por eles eram resultantes da doença mental ou dos efeitos das correntes.
Entretanto, essa libertação, embora importante sob um ponto de vista histórico, epistemológico e humanístico, resultou, com o correr dos anos, num outro aprisionamento dos doentes mentais, alocados agora em lugares específicos: os manicômios. Estas casas, passo a passo, passaram a inchar e se tornaram demasiadamente populosas, fato que impossibilitava um tratamento adequado a tantos doentes mentais.
Em todos os locais do mundo ocidental criaram-se esses manicômios, aqui no Brasil bem representados pelos hospícios Pedro II, no Rio de Janeiro, Juqueri, em São Paulo e São Pedro no Rio Grande do Sul.
A bem da verdade, é necessário dizer que os recursos terapêuticos nessa época eram muito precários. Por isto, após o nascimento de medicações psiquiátricas mais precisas, como os antipsicóticos e os antidepressivos, e de outras medidas psicossociais, foi possível reverter essa situação, desafogando essas casas já nas décadas de 50 a 70 do século XX.
Quando em 1808 Esquirol, discípulo de Pinel, lançou seus conceitos sobre a “monomania homicida” encontrou forte resistência tanto de médicos como de magistrados. Esta resistência foi intensificada a partir do ano de 1827. Porém, esses conceitos passaram a fazer parte no julgamento de criminosos, notadamente dos parricidas.
Os psiquiatras dos tribunais franceses, em 1835, tendo a frente Esquirol, emitiram pareceres no julgamento de um parricida (que muitos consideravam louco) condenado à morte e que pediu clemência. Ao que parece, inicia-se aí, na prática, a participação da psiquiatria na justiça penal, conseguindo a comutação da pena de morte, caso devidamente publicado nos “Annales d`hygiène publique et de médecine legale”. Ibid Esta revista publicava resumos de fatos e perícias médico-legais na época. CONTINUA
De acordo com Castel (Apud Peres), “a identificação da loucura nestes casos funcionava, por um lado, como impeditivo à aplicação das sansões penais (uma vez que faltava a responsabilidade do sujeito pelo ato praticado, a qual era a base da escola clássica do direito penal) e, por outro lado, servia como justificativa para a necessidade de um espaço próprio para reclusão e tratamento, além de afirmar a necessidade de um especialista para o seu diagnóstico”.
ResponderExcluirAberta essa porta de entendimento, criaram-se os manicômios judiciários em diversos países, como na Inglaterra, França e Estados Unidos, locais destinados aos doentes mentais que praticaram delitos. Aqui em Porto Alegre foi criado o Manicômio Judiciário em 4 de abril de 1925, o segundo no país, congregando pacientes até então internos no Hospício São Pedro.
Essas medidas também foram importantes de um ponto de vista científico e prático da assistência psiquiátrica, possibilitando um acolhimento mais compreensivo e um mais adequado tratamento dos comprometidos. Entretanto, assim como a “libertação” dos doentes mentais realizada por Pinel em 1793, novos problemas e desafios surgiram a partir do isolamento dos serviços psiquiátricos forenses em relação aos sistemas de saúde no mundo ocidental, pois as casas de custódia e tratamento permaneceram ligadas aos sistemas de segurança.
Por sua vez, o crescimento da criminalidade é responsável pelo aumento populacional nas prisões e nas casas de custódia e tratamento (instituições psiquiátrico-forenses). Por extensão, os pedidos de avaliações psiquiátricas determinadas pelos juizes das varas criminais abarrotam a agenda das instituições psiquiátrico-forenses.
O assunto a ser desenvolvido neste estudo procurou buscar dados ou informações a respeito de transtornos mentais em presídios no mundo ocidental contemporâneo e sobre a situação em que se encontram os doentes mentais internos nas instituições psiquiátrico-forenses ou em casas de custódia e tratamento.
Naturalmente, essas situações serão foco de pesquisa também em nosso país, além de contribuições obtidas da experiência psiquiátrica adquirida no Instituto Psiquiátrico Forense “Dr. Maurício Cardoso” do Rio Grande do Sul (IPFMC).
O estudo aqui feito é inicial e não possui a pretensão de esgotar o assunto, ao contrário, tem o propósito de uma abertura para que outros se sintam cativados a penetrar nessa extraordinária dimensão do ser humano tão pouco estudada, esclarecida e desafiadora à psiquiatria e à Lei.
FIM